segunda-feira, 30 de março de 2015

"Quando a gente conversa, contando casos, besteiras… Tanta coisa em comum, deixando escapar segredos. E eu não sei que hora dizer, me dá um medo. Que medo. É que eu preciso dizer que eu te amo, te ganhar ou perder sem engano. É, eu preciso dizer que eu te amo, tanto. E até o tempo passa arrastado só pra eu ficar do teu lado. Você me chora dores de outro amor, se abre e acaba comigo. E nessa novela eu não quero ser teu amigo. Eu já não sei se eu tô misturando, eu perco o sono lembrando em cada riso teu qualquer bandeira, fechando e abrindo a geladeira a noite inteira..."

Cazuza

Minha vida mudou muito nos últimos anos. Eu mudei muito nos últimos anos. Mudei sem oferecer a menor resistência. Mudei sem me surpreender com as mudanças. Elas simplesmente apareceram, aconteceram, me invadiram e se instalaram. Então, eu finalmente me senti em casa dentro de mim mesma. E hoje, mais do que nunca, sinto que não devo nada para ninguém. A gente demora demais para se livrar de pesos e culpas. Mas um dia, finalmente, a gente acorda. E descobre que tem uma vida inteirinha pela frente.

 Clarissa Corrêa

Acho que foi em 2004 ..

Acho que foi em 2004 que a vovó parou de andar. Simplesmente não conseguia mais, ela nunca foi muito ativa, dessas avós corre-mundo de novela, fazia mais o tipo avó de palavras-cruzadas, rezas católicas, Roberto Carlos e jogos do Internacional no radinho de pilhas. Meu avô era o oposto, estava sempre zanzando, sempre trazendo algo novo da rua, ou o usual hálito etílico da birita dominical com seus cupinchas de bar (quantas vezes ouvi a ordem “o almoço está quase pronto, vá buscar o seu avô!”). Eles não admitiriam – nem poderiam, entre tantos outros – mas sempre me senti o neto predileto, eu estava sempre por perto, era amoroso, gostava de brincar com os lóbulos molengas dela e assistir filmes de bang-bang e jogos de vôlei feminino com ele. Um dia meu avô me chamou no quarto. Supostamente minha avó não queria se levantar para tomar o último café do dia, e a lenga-lenga estava o deixando irritadiço. Então eu tive de dizer “ei, vô, a vó não caminha mais” e ele ficou meio confuso, as mãos na cintura, ofegando. Não deu outra, após alguns exames detalhados, o diagnóstico foi o tal do Mal de Alzheimer, coisa que só se dava com o avô dos vizinhos. Com mais alguns anos, minha avó deixou de se alimentar como um adulto, passou a se comunicar apenas com gemidos e sinais. E meu avô foi esquecendo quem eu era, quem era todo mundo. Só não esquecia da sua “Deusa”, como ele dizia, que estava sempre ali, na poltrona próxima à janela. Era um tanto irônico. Ela, com a memória de ferro intacta, vegetando. Ele, pra lá e pra cá nos corredores, perguntando às enfermeiras que horas o carro chegaria para levá-lo de volta para sua casa – onde ele já estava, de onde dificilmente saia. Na cabeça dele, estava, vai saber, na agência de Correios onde sempre trabalhou até uns 30 anos atrás. O tempo foi passando, ele deixou de assistir filmes de bang-bang, foi ficando cada dia mais esquecido, mas agressivo e impaciente, às vezes protagonizando umas cenas engraçadas, que a gente ria antes de chorar. Mas sempre zanzando. Corredor, cozinha, porta da frente sempre trancada, corredor, sala, banheiro, quarto de dormir. Como se estivesse num lugar nada residencial, trancado fora do mundo que levou décadas para construir. Então a vovó pegou uma pneumonia. Aí melhorou. Ficou ruim outra vez, os antibióticos não funcionavam. Até que me ligaram no meio da noite. “Ela piorou muito”, eu sabia, era apenas um eufemismo de quem não sabe como dar a notícia. Ao chegar no quarto, o rosto frio de quem não havia sofrido muito, os socorristas preenchendo formulários, legalizando o sono eterno. Ele deitado do lado, olhos fechados e o neuro-tique de mastigar as gengivas, sem nada desconfiar. Igual ele não discerniria, seria árduo explicar a diferença de vida e morte a um velhinho agredido por uma doença degenerativa avançada. Foi consenso não contar, às vezes a realidade apenas traz dores desnecessárias, felizes são os que vivem no mundo da lua. Pela manhã, enquanto ele contava piadas na sala, a funerária passou com o corpo. Isso foi há umas duas semanas, mais ou menos, e até hoje ele não perguntou por ela. Parece feliz, daquele jeito dele, dias bons, dias ruins, nenhum é igual. Não sei se foi o certo a fazer, mas foi o melhor. Há casos em que a correção não alivia o sofrimento de ninguém. Mas uma coisa me veio à cabeça, enquanto o padre fazia a extremunção divertindo o pessoal melhor do que faria Jerry Seinfeld, um verdadeiro showman. Será que ela não segurou a barra de viver entrevada esse tempo todo só para morrer quando justamente não o faria sofrer? Impossível saber, mas eu acho que sim, seria uma prova de amor contundente no meio dessa matilha de relações egoístas. E, apesar de não crer muito nessas coisas, também gosto de pensar que ela foi para um lugar melhor. Um lugar onde as pessoas lembram do seu nome.
  Gabito Nunes
Eu nunca fui aquela que quis pouco, porém, sempre me dei aos poucos. Quando a gente aprende que o amor é reflexo a gente sabe como dosar atitudes. Só se dá amor, se recebe amor.
Quando me atiro, dou corpo e alma. Ninguém tem meu corpo, sem minha alma, bem como, ninguém tem minha alma sem meu corpo. Os dois se tornam um só quando amo e nenhum deles existe separado.
Chico Buarque já dizia: "Morre de amor quem é capaz". E só é capaz de morrer por amor e pelo amor quem se entre...ga, se atira, mas, sabendo e sentindo que será correspondido. Do contrário, é sadomasoquismo, sofrimento. Amor bonito é amor recíproco.

Simony Thomazini
 

quinta-feira, 12 de março de 2015

Bonito são os casais que sentam para resolverem seus problemas, que seguram a mão do outro para sair na rua. São aqueles casais que além de sentirem atração pelo físico, são apaixonados pelo o que o outro é por dentro. Que riem sem tentarem forçar a risada. Que sabem que nada será fácil, mas se continuarem unidos nada os derrubará também. O amor é isto. É companheirismo. É saber ouvir o outro. É querer o bem de alguém. É sentir uma vontade de sorrir só de lembrar de certas coisas. Quando se entra em uma relação para valer, ambos lados precisam estar cientes de que furacões tentarão os atingir, mas se o amor de um dos lados for fraco, não será necessário um furacão. Até uma simples brisa já irá os separar. Quem ama enfrenta qualquer coisa. Quem ama engole o orgulho por medo de perder. O amor faz qualquer um evoluir.

 Collins Williams

Amizade vai além do momento.

Amizade vai além do momento. É comum ser amigo de contextos idênticos e se distanciar com os hábitos diferentes. Quando você está solteiro, o normal é fazer cumplicidade com quem frequenta festas e não se apega a uma relação. Quando está casado, o normal é criar laços com outros casais e privilegiar jantares e viagens. Quando está com filhos, o normal é sair com quem também está conhecendo as manhas e as longas manhãs dos bebês. Amizade verdadeira ultrapassa a normalidade e o... oportunismo do convívio. Estas nem são amizades verdadeiras, mas afinidades circunstanciais. São colegas de uma época, de uma fase, de um estilo. Acabam unidos provisoriamente por um gosto, circunscritos a uma vizinhança etária. Desaparecem diante de nossa primeira mudança, de nossa primeira transformação de personalidade. Permanecem quando há um interesse imediato, um arranjo benéfico do cotidiano, e somem quando não existe mais uma desculpa para se ver e se ouvir. Dependem de um pretexto para se manter próximos. Os conhecidos da academia ficarão no passado dos halteres assim que cansarmos dos treinos. Os conhecidos da faculdade ficarão na lembrança do quadro-negro assim que nos formarmos. Os conhecidos dos cursos de idiomas ficarão nos livros de exercícios assim que dominarmos uma nova língua. Amigo mesmo é o que não experimenta uma fase igual e permanece junto. Quebra o espelho e não se machuca com os cacos. Amigo mesmo é o que não tem filho e vem brincar com nossas crianças, não reclama dos gritos e dos choros e não diz que “pela trabalheira, não pensa em ser mãe ou ser pai tão cedo”. Não se justifica, está lado a lado qualquer que seja o cenário. É aquele que se separou e não amaldiçoa nossa paixão recente. É aquele que não tem emprego fixo e não inveja o nosso sucesso. É aquele que não tem nenhum problema grave e escuta com paciência e atenção as nossas lamúrias. Não é o de empatia fácil, feita de experiências semelhantes: só porque atravessa a fossa entende a nossa fossa, só porque transborda de alegria festeja a nossa alegria. Amigo não dá nem para contar nos dedos, pois sempre estará segurando nossa mão.

Fabricio Carpinejar
Eu nunca te pedi pra mudar, não por mim.
Se um dia tivesse que mudar, teria que ser
por você, acima de qualquer coisa. Eu queria
apenas um pouco mais de atenção, e quem
sabe, um pouco mais de carinho. Eu sei é o...
teu jeito. Mas saiba que me irrita, quem se
esconde atrás dessa fala.


Nicholas Sparks

Lembro quando ela disse..

Lembro quando ela disse ser controladora de suas emoções. Dei aquela risada amarela, aguardando que desmentisse, mas fez questão de reafirmar. Tudo bem, cada louco com sua loucura, mas ela foi além, disse que controla sua vontade de amar, aqui, na palma da mão.
Tratava-se de uma bela mulher. Ouvia Adriana Calcanhoto, Djavan e Marisa Monte, mas sabia a hora certa de curtir um bom samba e - porque não? - até um funk. Cinéfila de carteirinha, os filmes de Almodóvar eram sua insp...iração, mas também apreciava o bom jorra-sangue de Tarantino e os clássicos de Kubrick e Polanski . Sou obrigado a dizer que, do 'alto' de seus vinte e poucos anos, é uma das pessoas mais seguras que conheci.
Mas como ninguém é perfeito, não demorei pra perceber seu ponto fraco: relacionamentos. Pretendentes havia, e não eram poucos. Possuía predicados suficientes pra chamar atenção de qualquer homem. Poucas vezes passava o sábado a noite desacompanhada, mas raramente ultrapassava esse limite imposto por ela mesma. Dizia que não era o momento, não queria se apegar a ninguém, havia coisas mais importantes.
Que mulher é essa que tem o dom (ou a chaga?) de fazer o amor de fantoche? Como alguém consegue controlar algo tão incondicional? Dizia pro amor voltar amanhã, na semana que vem, ou se possível, só em 2086. Ela seguia o caminho inverso e bajulava-se por isso. Não era minha intenção, e sei que se meter em vida alheia não é coisa que se faça, mas não tinha jeito: Já estava envolvido.
Tentei explicar o quão adorável é dar-se uma chance, deixar que as vontades e o acaso tomem a frente da situação, que nos conduza, mas de maneira vagarosa pra que possamos aproveitar cada momento, cada segundo que nos proporcionam. Perceber que aquele esboço de sorriso ao reparar sua chegada já vale as duas horas enfurnado dentro daquele ônibus, que junto àquela pessoa dá-se a volta ao mundo quantas vezes se quer. Disse que amor não era se apegar à primeira pessoa que surgir, mas que se for pra acontecer, que dê licença e abra passagem. Afirmei que autoconfiança é essencial, mas que em excesso pode virar egocentrismo. Disse que o amor é o melhor da vida, porque simplesmente nos faz feliz.
Gostaria de dizer o contrário, mas seria ilusão. Ela não cedeu, e foi além. Quis apostar comigo que teria amor quando quisesse. Abaixei a cabeça, recusei sua proposta e, conclusivo, me rendi. Ela inverteu os papéis. Que o melhor - e por vezes mais cruel professor, o tempo, trate de mostrá-la que amor não é meio, é fim. Não é aposta. É recompensa.

 Brunno Leal
Bem ou mal, ela sente sua ausência. Toda noite, evita estar em casa lembrando que o espaço do apartamento triplicou por um milhão. Sente falta de camisetas espalhadas aleatoriamente. Fica lembrando ele cozinhando espaguete al pesto, ou quando ele sentava na janela dedilhando “Tears In Heaven”, ou assistia o colorado comportadinho, roendo as unhas sem parar, os pés no sofá. Hoje, coleciona casos com cafajestes fajutos. Sente falta dos sermões que levava por andar descalça no chão frio. Verifica o funcionamento do telefone: tu-tu-tu. Presos pela liberdade, prosseguem cada um na sua, conectados por um fio invisível que não conduz mais eletricidade. Um fio de saudade dissonante e a certeza de que, amor como aquele deles, não acontece no tocar de uma varinha de condão.

Gabito Nunes